maio 01, 2008

LIVRE ARBÍTRIO II

A questão do livre arbítrio cria mais do que um simples axioma. Ela supõe a quebra da soberania de Deus, posto que, se alguém ou alguma coisa é capaz de existir livre de qualquer causa, logo, Deus não é soberano. Admitindo-se que Ele é soberano, como a Sua própria Palavra o diz, qualquer partícula, em qualquer canto do universo que Lhe escape ao controle, o faz mentiroso e um ser relativizado. Neste caso, o homem terá de optar por ser "deus" no lugar do verdadeiro Deus soberano. Como esta possibilidade é, por si mesma, absurda, resta apenas reconhecer que o homem nem é livre, nem possui poder de arbitrar nada fora da vala comum nos liames da natureza escravizada pelo pecado.
Não há consenso sobre o conceito do livre arbítrio nem mesmo na filosofia. Para os filósofos a possibilidade de o homem fazer escolhas metafísicas entre alternativas genuínas acarreta, no mínimo, três situações: a determinista, a libertarianista e a compatibilista.
O determinismo assevera que todos os acontecimentos, inclusive vontades e escolhas humanas, são causados por acontecimentos anteriores, ou seja, o homem é fruto direto do meio, logo, destituído de liberdade de decidir e de influir nos fenômenos em que toma parte. O determinismo rejeita a ideia que os homens têm algum livre arbítrio. Assim, o determinismo admite que há uma causa causadora das escolhas humanas, seja pela vontade, seja fora da vontade.
A doutrina libertarianista opõe-se ao determinismo, uma vez que defende a existência do livre arbítrio pleno nos indivíduos. Uma das formas de libertarianismo é o indeterminismo e defende que as ações livres do homem são produzidas por efeitos sem causas anteriores ou fora das próprias ações. Entretanto, há os que creem, que, ao invés da volição ser um efeito sem causa, defendem que o livre arbítrio e a ação do agente sempre produz o evento. Esta situação é bastante contraditória, pois admite evento determinado pela liberdade de agir, mas como alguém age livremente, se depende da liberdade ou da vontade para isso? Daí, surge a dificuldade de dar à liberdade uma categoria exequível ou factível. Produz-se, neste caso, uma contradição conceitual.
Há ainda o compatibilismo que é a visão que o livre arbítrio emerge mesmo em um universo sem incerteza metafísica. Compatibilistas podem definir o livre arbítrio como emergindo de uma causa interior, por exemplo os pensamentos, as crenças e os desejos. Seria resumidamente o livre arbítrio que respeita as ações, ou pressões, internas e externas. A filosofia que aceita tanto o determinismo, quanto a liberdade de escolhas é chamada de “soft determinism”, expressão cunhada por William James para designar o que hoje chamamos de livre arbítrio compatibilista. Desta forma, tentou-se encontrar um meio termo ou uma via exequível.
A visão oponente ao Compatibilismo é o Incompatibilismo, sendo que esta visão não admite qualquer maneira de conciliar a crença em um universo determinístico com o livre arbítrio verdadeiro. Assim, ela acaba por reforçar o determinismo, e, com isto, nega o compatibilismo.
Spinoza compara a crença humana no livre arbítrio a uma pedra pensando que escolhe o caminho que percorre enquanto cruza o ar até o local onde cai. Ele diz: "as decisões da mente são apenas desejos, os quais variam de acordo com várias disposições"; "não há na mente vontade livre ou absoluta, mas a mente é determinada a querer isto ou aquilo por uma causa que é determinada por sua vez por outra causa, e essa por outra e assim ao infinito"; "os homens se consideram livres porque estão cônscios das suas volições e desejos, mas são ignorantes das causas pelas quais são conduzidos a querer e desejar" (respectivamente Spinoza, Ética, livro 3, escólio da proposição 2; livro 2, proposição 48; apêndice do livro 1).
Schopenheur, concorrendo com Spinoza, escreve: "cada um acredita de si mesmo a priori que é perfeitamente livre, mesmo em suas ações individuais, e pensa que a cada momento pode começar outra maneira de viver [...]. Mas a posteriori, através da experiência, ele descobre, para seu espanto, que não é livre, mas sujeito à necessidade, que apesar de todas as suas resoluções e reflexões ele não muda sua conduta, e que do início ao fim da sua vida ele deve conduzir o mesmo caráter o qual ele mesmo condena."
Há filósofos que consideram a expressão "livre arbítrio" absurda. Thomas Hobbes diz que se esse é um poder definido pela vontade, então não é livre, nem não-livre. É um erro categorial atribuir liberdade à vontade. John Locke concorda com ele e atribui um caráter de ridicularidade discutir esta questão.
Também se pergunta se um ato causado pode ser livre ou se algum ato não-causado pode ser desejado, tornando o livre arbítrio um oximoro, isto é, reunir termos contraditórios e paradoxais. Alguns compatibilistas argumentam que essa alegada falta de fundamentação para o conceito de livre arbítrio é ao menos parcialmente responsável pela percepção de uma contradição entre determinismo e liberdade. Além disso, de um ponto de vista compatibilista o uso de "livre arbítrio" em sentido incompatibilista pode ser visto como uso da linguagem exageradamente carregada de conotações emocionais.
Então, percebe-se que não há concordância sobre livre arbítrio nem mesmo na filosofia humana, quanto mais na esfera espiritual.

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