domingo, julho 30

COM O ROSTO DESCOBERTO

II Co. 3:18 - "E não somos como Moisés, que trazia um véu sobre o rosto, para que os filhos de Israel desvanecia; mas o entendimento lhes ficou endurecido. Pois até o dia de hoje, à leitura do velho pacto, permanece o mesmo véu, não lhes sendo revelado que em Cristo é ele abolido; sim, até o dia de hoje, sempre que Moisés é lido, um véu está posto sobre o coração deles. Contudo, convertendo-se um deles ao Senhor, é-lhe tirado o véu. Ora, o Senhor é o Espírito; e onde está o Espírito do Senhor aí há liberdade. Mas todos nós, com rosto descoberto, refletindo como um espelho a glória do Senhor, somos transformados de glória em glória na mesma imagem, como pelo Espírito do Senhor."
Uma das questões mais graves no Cristianismo moderno e pós-moderno é a incapacidade de identificar a relevância da Graça como marca da Nova Aliança. A maioria dos religiosos considera a Lei como o pré-requisito para se alcançar a Graça. Não compreendem, porque não creem, que a Graça cumpre e termina a Lei. É algo semelhante à teoria dos conjuntos: a ideia de continente e conteúdo. Ou seja, a Graça inclui e contém plenamente a Lei, pois Cristo veio exatamente para cumprir toda a Lei, a qual o homem decaído jamais poderia cumprir integralmente conforme Rm. 10:3 - "Pois Cristo é o fim da lei para justificar a todo aquele que crê." Vê-se que é somente todo aquele que crê!
Portanto, é fundamental entender que o termo "fim" no texto acima, não é apenas no sentido de finalidade. Traz em si, principalmente, o sentido de término ou fim. O vocábulo utilizado no grego neotestamentário é "telos" [τελος], ou seja, 'fim de um evento, último de uma série.' Desta forma a expressão grega achada no texto de Rm. 10:4 é "telos nomon Christós." Tal expressão pode ser traduzida, sem qualquer prejuízo, como: "Cristo terminou a Lei."
Desta forma, a resistência à significação de que Cristo cumpriu toda a Lei e a terminou reside no fato que o homem, não regenerado, necessita de um regulador comportamental para apaziguar a sua alma atormentada pela natureza pecaminosa. Tal natureza sempre cria um paradoxo no coração do homem religioso, pois ele lê as Escrituras e se apropria apenas intelectualmente da verdade a qual tenta assumir, mas a sua natureza pecaminosa não resolvida na cruz entra em crise. É como o homem que, caindo numa latrina sai dali e toma de um pão para comer, porém sem antes se lavar.
Jo. 12:47 - "E, se alguém ouvir as minhas palavras, e não as guardar, eu não o julgo; pois eu vim, não para julgar o mundo, mas para salvar o mundo." Este texto joga luz sobre a questão aqui abordada, quando mostra claramente que Cristo não veio executar a Lei contra o pecador, mas veio, precisamente para livrá-lo da culpa do pecado gerada pela lei. Quando alguém assume a culpa de outro e paga pelos seus pecados ocorreu uma expiação que isenta o culpado. Igualmente, o apóstolo Paulo esclarece que, "... Ora, nós sabemos que tudo o que a lei diz, aos que estão debaixo da lei o diz, para que se cale toda boca e todo o mundo fique sujeito ao juízo de Deus; porquanto pelas obras da lei nenhum homem será justificado diante dele; pois o que vem pela lei é o pleno conhecimento do pecado. Mas agora, sem lei, tem se manifestado a justiça de Deus, que é atestada pela lei e pelos profetas..."
Rm. 5: 1 e 2 - "Justificados, pois, pela fé, tenhamos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo, por quem obtivemos também nosso acesso pela fé a esta graça, na qual estamos firmes, e gloriemo-nos na esperança da glória de Deus." Ora, verbo justificar está conjugado em tempo e modo claramente cabal ou terminativo. Isto indica que, uma vez tornados justos pela fé, o resultado é a paz com Deus e não a sustentação de um comportamento dualista: guardar a lei para obter paz e fé, como tenta fazer a maioria dos religiosos. Esta duplicidade gera muito sofrimento e repressão da natureza pecaminosa residente no homem não regenerado. Esta situação acabará por explodir, a qualquer tempo, em forma de doenças, psicopatias e anomalias comportamentais. Tais coisas são a razão de muitos conflitos dentro das igrejas onde, teoricamente, deveria reinar plena harmonia.
Outrossim, o homem decaído ganha a Graça para crer e receber, a verdade, que Cristo cumpriu em si mesmo a Lei, a fim de que o pecador seja total e plenamente justificado em sua morte substitutiva e inclusiva na cruz. Entretanto, é necessário que isto seja recebido como verdade de Deus e não como mera letra. A aniquilação do pecado  por Cristo está doutrinada em Hb. 9:26 - "... doutra forma, necessário lhe fora padecer muitas vezes desde a fundação do mundo; mas agora, na consumação dos séculos, uma vez por todas se manifestou, para aniquilar o pecado pelo sacrifício de si mesmo."
Assim, a aniquilação a que se refere o texto acima implica em retirar total e absolutamente a natureza pecaminosa do homem, tornando-o justificado. Vê-se que o texto afirma que tal aniquilação foi "de uma vez para sempre" e não algo momentâneo.
Finalmente, tem-se que o homem justificado pela inclusão na morte de Cristo, bem como na sua consequente ressurreição, aparece perante o trono de Deus com o rosto descoberto. Tal homem pecador regenerado é apresentado perante Deus aceitável em Cristo e não em sua justiça própria.
Sola Gratia!

domingo, janeiro 22

QUEM É O DIABO V

II Co. 11: 14 e 15 - "E não é de admirar, porquanto o próprio Satanás se disfarça em anjo de luz. Não é muito, pois, que também os seus ministros se disfarcem em ministros da justiça; o fim dos quais será conforme as suas obras."
A imagem do Diabo como um ser dotado de rabo, chifres, peludo, mal cheiroso, vermelho, ou com cara e pés de bode é o resultado do ideário popular imposto pela cultura religiosa desde a Idade Média. Era um artifício da igreja dominante para manter o povo sujeito às suas determinações e dogmas com base no medo e não na verdade. Embora as Escrituras não revelam muito sobre detalhes da sua queda e condição anterior a queda, o pouco que revela é o suficiente para que não permitam enganos e fantasias religiosas.
Uma simples pesquisa virtual sobre as opiniões acerca dos textos de Ezequiel 28 e Isaías 14, verificar-se-ão grandes controvérsias sobre a interpretação correta dos conteúdos destes dois textos. Há os que tomam os tais textos em sua literalidade e os que toma-os em sua forma figurada. A maioria, porém, opta por afirmar que em Ezequiel é tão somente uma repreensão dirigida ao rei da cidade de Tiro, e, em Isaías é apenas uma profecia acerca do rei da Babilônia.  Isto restringe muito a extensão e a significação maior dos textos. 
Muito bem! A fim de demonstrar que tais profecias tratam da dupla referência profética de modo sarcástico, pode-se tomar como texto paralelo o de Dn. 10: 11 a 13 - "E me disse: Daniel, homem muito amado, entende as palavras que te vou dizer, e levanta-te sobre os teus pés; pois agora te sou enviado. Ao falar ele comigo esta palavra, pus-me em pé tremendo. Então me disse: não temas, Daniel; porque desde o primeiro dia em que aplicaste o teu coração a compreender e a humilhar-te perante o teu Deus, são ouvidas as tuas palavras, e por causa das tuas palavras eu vim. Mas o príncipe do reino da Pérsia me resistiu por vinte e um dias; e eis que Miguel, um dos primeiros príncipes, veio para ajudar-me, e eu o deixei ali com os reis da Pérsia." Vê-se que o contexto é aquele em que Daniel se põe a orar pelo pecado do povo e confessar o seu próprio pecado. Deus ouviu a oração de Daniel desde o primeiro momento e decidiu enviar o anjo para confortá-lo e comunicar suas decisões. O mensageiro de Deus foi enviado, mas alguém se interpôs entre o anjo enviado e Daniel. Um príncipe do reino da Pérsia se pôs diante do anjo e Daniel por vinte e um dias. Deus então enviou o arcanjo Miguel para ajudar na batalha e o mensageiro celestial pode, então, ir até Daniel. Ora, é óbvio que, o tal príncipe da Pérsia e os reis mencionados não eram humanos, pois qual humano pode manter uma batalha no espaço celeste contra mensageiros espirituais? Por que o anjo Miguel se deslocaria da habitação celestial para batalhar contra um príncipe da Pérsia? Então, o tal príncipe era o Diabo identificado tipologicamente no príncipe do reino da Pérsia, porque nesse tempo a Pérsia controlava basicamente todo o Oriente e parte do Ocidente.
As Escrituras afirmam que Satanás e seus anjos seguidores vivem no espaço sideral próximo à Terra conforme Ef. 2: 1 e 2 - "Ele vos vivificou, estando vós mortos nos vossos delitos e pecados, nos quais outrora andastes, segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe das potestades do ar, do espírito que agora opera nos filhos de desobediência..." O príncipe das potestades do ar é o Diabo, porque ele é o chefe dos anjos caídos. São denominados 'poderes do ar', sendo esta expressão no texto grego [αρχοντα της εξουσιας του αερος], que transliterado é: "arkonta tes exousías tou aeros". O vocábulo "aeros" no grego neotestamentário significa: 'o espaço acima da atmosfera terrestre'. Isto é confirmado no texto de Ef. 6:12 - "... pois não é contra carne e sangue que temos que lutar, mas sim contra os principados, contra as potestades, conta os príncipes do mundo destas trevas, contra as hostes espirituais da iniquidade nas regiões celestes." Então, os anjos caídos e seu comandante, o Diabo, tem por habitação as regiões celestiais, as quais, denominam-se genericamente céus. 
O texto de abertura mostra com clareza meridiana que, o próprio Satanás se transfigura em anjo de luz. Isto significa dizer que, aos olhos dos homens desprovidos da luz de Cristo, o Diabo apresenta-se como alguém do bem e vindo de Deus. Ele pode dizer coisas reconfortantes, porque a alma humana deseja a gratificação e a satisfação dos seus anseios. Desta forma, muitas pessoas se deixam enganar, apenas porque ouvem pregações que trazem conforto emocional, isto é, almático. Muitos seguem cultos e crenças religiosas, apenas porque se sentem bem naquele ambiente. Trata-se, portanto, de uma religião para produzir consolo e alívio das angústias geradas pela natureza pecaminosa.
Ora, a primeira regra da verdade bíblica é o evangelho, o qual mostra ao homem que ele é pecador e mau por natureza e não apenas por atos. Após a exposição desta verdade a alma humana tem duas opções: rejeitar e prosseguir na sua busca apenas religiosa, ou reconhecer-se portadora da natureza pecaminosa. Geralmente, os pecadores eleitos se curvam diante da dureza do evangelho e se rendem à cruz. Aquelas almas cujos nomes não estão escritos no livro da vida do Cordeiro, tendem a rejeitar, veementemente, a mensagem da cruz e do novo nascimento. Estas pessoas estão firmadas na justiça própria e na lei do esforço e dos méritos próprios para alcançar a redenção.
Ainda o texto de abertura alerta para o fato que os anjos caídos, seguidores de Satanás, se passam por ministradores da justiça. Ora, nunca a humanidade ansiou tanto por ver, concretamente, a justiça. É neste contexto que aparecem os espíritos enganadores oferecendo redenção fácil ou por meio de justiça própria. Por exemplo, há inumeráveis doutrinas esdrúxulas as quais pregam a purificação e a evolução dos espíritos por meio de sucessivas reencarnações. Espíritos de homens não evoluem, estão apenas separados de Deus ou reconciliados com Ele. Ora, o tal ensino evolucionista é diabólico, porque rejeita o pecado, a justiça de Deus, e a condenação eterna. Finalmente, tais ensinos pretendem estipular uma forma de justiça divina sem a cruz e sem a inclusão do pecador na morte com Cristo. É neste sentido que tais espíritos enganadores são ministradores de justiça conforme I Tm. 4: 1 e 2 - "Mas o Espírito expressamente diz que em tempos posteriores alguns apostatarão da fé, dando ouvidos a espíritos enganadores, e a doutrinas de demônios, pela hipocrisia de homens que falam mentiras e têm a sua própria consciência cauterizada..." É o Espírito Santo quem afirma que alguns dariam as costas à fé. Eles não apostatam da Igreja, mas apenas da fé. Os tais dão ouvidos a espíritos enganadores que são anjos caídos sob a liderança do Diabo, ou a homens subordinados a tais espíritos caídos. Qualquer doutrina que não seja estritamente bíblica e que não mostra que o homem é pecador por natureza e não apenas por atos, é doutrina de demônios.
Sola Scriptura!
Sola Fide!
Sola Gratia!

sábado, janeiro 21

QUEM É O DIABO IV

I Tm. 3: 6 e 7 - "... não neófito, para que não se ensoberbeça e venha a cair na condenação do Diabo. Também é necessário que tenha bom testemunho dos que estão de fora, para que não caia em opróbrio, e no laço do Diabo."
Muito se especula sobre qual tenha sido o pecado do anjo querubim que veio a ser o Diabo. Tal anjo foi criado por Deus em perfeição conforme já foi pontuado no texto de Ezequiel capítulo vinte e oito. 
Há em quase todas as crenças um dualismo ora brando, ora maniqueísta. Tal dicotomia entre o bem e o mal produziu a crença em deuses ou divindades do bem e do mal opostas entre si. Algumas dessas crenças afirmam que tal oposição é essencial ao equilíbrio do universo. O inusitado é que, as referidas crenças atribuem, tanto aos deuses do bem, como aos deuses do mal igual capacidade e merecimento de culto e adoração. Na fé cristã não é assim! O conceito de bem e mal nas Escrituras são distintos e não complementares, sendo Deus a fonte de todo o bem e o pecado a fonte de todo o mal moral conforme Tg. 1: 13 a 15 - "Ninguém, sendo tentado, diga: sou tentado por Deus; porque Deus não pode ser tentado pelo mal e ele a ninguém tenta. Cada um, porém, é tentado, quando atraído e engodado pela sua própria concupiscência; então a concupiscência, havendo concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, sendo consumado, gera a morte." Entretanto, o conceito de bem e mal é bastante distorcido no ideário popular, pois consideram o que lhes agrada ou deseja como o bem, e tudo o que lhes é indesejável e desagradável como o mal. Atribuem o bem apenas a Deus e o mal apenas ao Diabo. Porém, deixam de considerar que há bem que é para o mal e há mal que é para o bem, pois quem conduz o universo e tudo que nele há é Deus. Portanto, não se pode confundir a visão humana de bem e mal com o controle soberano de Deus conforme as Escrituras.
Deus não criou um Diabo, um ser maléfico, mas um anjo da ordem dos querubins, perfeito, formoso, coberto de honra e de autoridade. A este anjo foi dado o encargo de conduzir a adoração e o louvor perfeito, porque a expressão "para proteger" [הַסּוֹכֵךְ] "hasokhechno hebraico de Ezequiel 28: 14 significa literalmente "quem conduz." Há, segundo as Escrituras, nove categorias de anjos, a saber: principados, potestades, virtudes, dominações, tronos, querubins, arcanjo, serafins e anjos simples. Os querubins, cuja ordem pertenceu o Diabo, são apresentados ora como crianças aladas, ora como animais conforme Ap. 4: 6 a 9 - "... também havia diante do trono como que um mar de vidro, semelhante ao cristal; e ao redor do trono, um ao meio de cada lado, quatro seres viventes cheios de olhos por diante e por detrás; e o primeiro ser era semelhante a um leão; o segundo ser, semelhante a um touro; tinha o terceiro ser o rosto como de homem; e o quarto ser era semelhante a uma águia voando. Os quatro seres viventes tinham, cada um, seis asas, e ao redor e por dentro estavam cheios de olhos; e não têm descanso nem de noite, dizendo: Santo, Santo, Santo é o Senhor Deus, o Todo-Poderoso, aquele que era, e que é, e que há de vir. E, sempre que os seres viventes davam glória e honra e ações de graças ao que estava assentado sobre o trono, ao que vive pelos séculos dos séculos ..." 
Desta forma o anjo querubim não foi tentado ao pecado, porque não havia nada e ninguém que o tentasse. Portanto, ele é auto-pecador, contrariamente ao homem que é heteropecador, visto que foi por ele tentado ao pecado. Foi por livre escolha que o anjo perfeito em seus caminhos optou pelo desejo de ser um deus e caiu. Após a sua queda passou a ser o Diabo, Satanás, Dragão e Antiga Serpente. Por esta razão é que o Diabo se materializou na serpente no Éden e, futuramente se corporizará no Anticristo como o dragão conforme diversas passagens do livro de Apocalipse. Foi tipificado no rei de Tiro e inspirador de Pedro de acordo com o evangelho de Mateus capítulo dezesseis, verso vinte e três.
O texto de abertura deste estudo mostra, por comparação, que a causa da condenação do anjo querubim foi a soberba. A concretização final de tal condenação foi a queda, ou seja, a sua perda das funções e expulsão do reino de Deus. O texto demonstra ainda que o anjo querubim caiu em seu próprio laço, a saber, optou pelo pecado e por ele se tornou Diabo e Satanás. O apóstolo Tiago mostra em sua epístola, capítulo um, a sequência que conduz à perdição: tentação, atração, engano, desejo, pecado e morte, ou seja, separação de Deus. Isto foi o que ocorreu com o anjo querubim e que o levou a morrer eternamente para Deus. Ele possui um grande número de demônios que foram anjos que aderiram à sua rebelião no céu e, por isso, caíram juntamente com ele conforme Ap. 12: 3 e 4 - "Viu-se também outro sinal no céu: eis um grande dragão vermelho que tinha sete cabeças e dez chifres, e sobre as suas cabeças sete diademas; a sua cauda levava após si a terça parte das estrelas do céu, e lançou-as sobre a terra..." O dragão vermelho é o Diabo, as sete cabeças simbolizam o domínio pleno dos reinos terrestres, os dez chifres são governantes abertamente subordinados a Satanás. Os dez diademas representam poderes político-econômicos sob o comando do Diabo, declaradamente. Estrelas, no texto bíblico, sempre representam anjos. Tais anjos foram arrastados pelo Diabo em sua queda. Esta é a visão do apóstolo João, quando desterrado na Ilha de Patmos pelo imperador de Roma. 
Sola Scriptura!
Sola Gratia!
Soli Deo Gloria!

quinta-feira, janeiro 19

QUEM É O DIABO III

Ez. 28: 12 a 15 - "Tu eras o selo da perfeição, cheio de sabedoria e perfeito em formosura.  Estiveste no Éden, jardim de Deus; cobrias-te de toda pedra preciosa: a cornalina, o topázio, o ônix, a crisólita, o berilo, o jaspe, a safira, a granada, a esmeralda e o ouro. Em ti se faziam os teus tambores e os teus pífaros; no dia em que foste criado foram preparados. Eu te coloquei com o querubim da guarda; estiveste sobre o monte santo de Deus; andaste no meio das pedras afogueadas. Perfeito eras nos teus caminhos, desde o dia em que foste criado, até que em ti se achou iniquidade."
O contexto do qual esta porção foi retirada é daqueles com dupla referência, ou seja, se refere, tanto a Itobaal rei de Tiro, como ao comportamento do anjo querubim que veio a ser o Diabo ou Satanás. O referido rei experimentou grande progresso mercantil, diplomático e militar. Exigia tributos pesados dos povos dominados e se apoiava em um comércio intenso no Mar Mediterrâneo. Era um reinado cujos governantes e homens prósperos não tinham escrúpulos e praticavam culto pagão a Baal com sacrifícios humanos, além da baixa moralidade social. Diversos profetas do velho testamento vaticinaram sobre a ruína deste reino, o que, de fato, aconteceu primeiro com a invasão de Nabucodonosor rei de Babilônia e, depois, com a total destruição por Alexandre Magno do Império Greco-Macedônio em 332 a. C.
O texto se refere, mais enfaticamente, ao governante da cidade de Tiro do verso 1 ao verso 11, sendo que, no verso 2 ele é identificado como príncipe de Tiro. Por vezes o título de príncipe e rei são intercambiáveis, ou seja, possuem o mesmo sentido. Não se trata de etimologia, mas de semântica, isto é, de sentido. Este rei foi conhecido como Ethbaal ou Itobaal, tendo sido um sacerdote que assassinou o rei anterior de Tiro - Pheletes - e usurpou o poder, tendo governado por 32 anos. A partir do verso 12, a ênfase recai, predominantemente, a um ser em um reino sobrenatural. É uma descrição de como era o anjo querubim antes da queda. A partir do verso 15 passa-se a descrever o que iria acontecer, tanto ao rei de Tiro, como ao que aconteceu ao querubim após a queda. Este artifício linguístico ocorre em diversas outras passagens, das quais focar-se-á em Mc. 8:33 - "Mas ele, virando-se olhando para seus discípulos, repreendeu a Pedro, dizendo: para trás de mim, Satanás; porque não cuidas das coisas que são de Deus, mas sim das que são dos homens." No contexto, Jesus está avisando aos discípulos que irá morrer. Entretanto, Pedro um dos discípulo de Jesus, tenta convencê-lo a não morrer. Todavia Jesus o repreende, mas a repreensão é dirigida a Satanás que inspirava a Pedro neste ardil contrário ao que estava preordenado por Deus. O texto esclarece ainda que, quem cuida das coisas humanas ou terrenas é Satanás. Não era Pedro Satanás, mas estava sendo instrumento dele na sua argumentação contra a morte de Jesus, o Cristo. Tanto no hebraico, como no grego neotestamentário, estas duplas referências são, quase sempre, sarcásticas.
Neste estudo o foco é a identidade do Diabo na descrição do profeta Ezequiel. O texto descreve o Éden como jardim de Deus e diferente do Éden terrestre que foi um jardim para o homem. Sabe-se que o Éden terrestre era um domínio vegetal, enquanto o Éden descrito no texto ezequeliano era um domínio mineral. É dito que o Diabo era um anjo querubim chefe da guarda, ungido e estabelecido no monte santo de Deus, vivendo sob o brilho das pedras preciosas. A palavra querubim provém do hebraico [כרוב] "qeruv" e no texto de Ezequiel aparece no plural [כרובים] ou "queruvim". Os querubins são seres sobrenaturais, ora representados com aparência de animais, ora como anjos alados no culto mosaico. Diversas figuras de querubins foram esculpidas nas paredes e portas do primeiro templo de Jerusalém. O texto afirma que este querubim era perfeito em formosura e que, para ele foram preparados instrumentos musicais no dia em que foi criado: pífaros e tambores. Também é dito que era perfeito em seus caminhos até o dia em que, nele, foi achada a iniquidade. A iniquidade a que se refere o texto é a soberba e a arrogância de querer ser deus conforme Ez. 28:2 - "Assim diz o Senhor Deus: visto como se elevou o teu coração, e disseste: eu sou um deus, na cadeira dos deuses me assento, no meio dos mares; todavia tu és homem, e não deus, embora consideres o teu coração como se fora o coração de um deus." Lembre-se que, neste contexto inicial é uma descrição da arrogância, tanto do rei de Tiro, como da soberba do anjo querubim que quis ser deus. Trata-se de uma argumentação por símile.
A iniquidade é uma prática contrária à equidade, ou seja, ao que é justo segundo o padrão da justiça de Deus. Ocorre a iniquidade quando o pecado chega ao coração do homem e o faz perder a noção dos valores morais e espirituais. A iniquidade faz a mente do homem se corromper a ponto de não mais discernir entre o certo e o errado, o justo e o injusto. 
Portanto a identidade do Diabo é o que dele se declara nas Escrituras. O que passa disso é apenas crendice resultante do ideário popular manipulado pela religião. Outro texto que dá a noção exata do pecado do anjo querubim que veio a ser o Diabo está em Is. 14: 12 a 14 - "Como caíste do céu, ó estrela da manhã, filha da alva! como foste lançado por terra tu que prostravas as nações! E tu dizias no teu coração: eu subirei ao céu; acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono; e no monte da congregação me assentarei, nas extremidades do norte; subirei acima das alturas das nuvens, e serei semelhante ao Altíssimo." Esta descrição também segue a técnica da dupla referência, pois descreve tanto a arrogância, quanto a queda do rei da Babilônia e também os desejos e ambições do querubim chefe da guarda no Reino de Deus. Subir acima das estrelas, ou seja, dos anjos celestes, acima das nuvens, a saber, no domínio celestial, e ser semelhante ao Altíssimo é um desejo soberbo que arruinou o anjo perfeito, formoso e chefe dos demais anjos. Por isso este anjo querubim foi lançado fora da presença de Deus. O própria Jesus, o Cristo atesta esta verdade conforme Lc. 10:18 - "Respondeu-lhes ele: eu via Satanás, como raio, cair do céu."
Solo Christus!
Soli Deo Gloria!

quarta-feira, janeiro 18

QUEM É O DIABO II

II Co. 2: 10c e 11 - "... para que Satanás não leve vantagem sobre nós; porque não ignoramos as suas maquinações."
Viu-se no primeiro estudo que o arqui-inimigo de Cristo é um ser real. O fato de ser espírito não lhe retira a realidade e a capacidade para agir por meio dos seus demônios e de pessoas não regeneradas. Na cultura popular ele recebe diversas alcunhas de acordo com a visão mitológica e lendária que a religião faz dele. A Bíblia, porém, o chama de Satanás, Diabo, Antiga Serpente, Belzebu, Dragão e Espírito Imundo. Em nenhum texto escriturístico é chamado de Lúcifer, senão nas traduções originadas da Vulgata de S. Jerônimo, o qual traduziu uma locução adjetiva como se fosse um substantivo. Isto acabou por conferir na crendice religiosa um título que, realmente, pertence a Jesus, o Cristo e não a Satanás.
A iniciativa de escrever sobre tal criatura sombria deve-se à necessidade de fazê-lo conhecido pelo que é e não pelo ideário popular e religioso. Ignorá-lo é tudo o que ele quer, pois assim poderá prosseguir com seu ódio e assédio à Igreja. A melhor forma de resistir ao inimigo é conhecendo-lhes as forças e artimanhas e não fugindo. 
Em 1991 foi criada a Aliança Ateísta, a qual se propõe a doutrinar o público sobre ateísmo e secularismo. Começou nos EUA, tendo sido formada por quatro grupos ateus. Entretanto, dez anos depois já possuía diversos grupos espalhados pelo mundo. Por isso, tornou-se a Aliança Ateísta Internacional em 2001. Em 2010 e 2011, desmembrou-se em Aliança Ateísta Americana e Aliança Ateísta Internacional. O lema da AAI é: "Por um Mundo Secular." A negação de Deus é uma condição natural do homem e não uma escolha. Todo homem nasce ateu e, mesmo depois de ter consciência plena ou pertencer a algum tipo de credo, continua ateu. Ateus negam, tanto a existência de Deus, quanto a realidade do Diabo. Isto é tudo o que o Diabo quer!
Conhecer Deus é operado e operacionalizado pelo próprio Deus soberanamente. A isto dá-se o nome técnico de monergismo. Ter uma religião e professar uma determinada crença, na maioria dos casos, não retira o homem do ateísmo. Todos aqueles que professam o ateísmo imaginam que o fazem por escolha livre. Entretanto, não o é. É por força da natureza decaída e corrompida pelo pecado da incredulidade conforme Jo. 16:9 - "...do pecado, porque não creem em mim..." Muitos homens sobrevivem de uma espécie de crença de segunda mão, porque reproduzem ideias e comportamentos herdados da família, da sociedade e da cultura em que vive. A maioria dos religiosos imagina que o pecado é o que a pessoa faz de errado ou de ruim. Ora, o pecado é o que o homem é, a saber, incrédulo. Por isto, se tornou morto para Deus. Morte, neste sentido, nada tem a ver com a degradação da vida biológica, mas com a perda da ligação espiritual com Deus por causa da natureza pecaminosa inoculada por Satanás. Portanto, o pecado que separa o homem de Deus é a incredulidade. Os atos pecaminosos, a saber, erros, deslizes, fraquezas e maldades são consequências do pecado e não a causa. 
O texto que melhor caracteriza o ateísmo natural no homem é o de Rm. 1: 20 e 25 - "Pois os seus atributos invisíveis, o seu eterno poder e divindade, são claramente vistos desde a criação do mundo, sendo percebidos mediante as coisas criadas, de modo que eles são inescusáveis; porquanto, tendo conhecido a Deus, contudo não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças, antes nas suas especulações se desvaneceram, e o seu coração insensato se obscureceu. Dizendo-se sábios, tornaram-se estultos, e mudaram a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível, e de aves, e de quadrúpedes, e de répteis. Por isso Deus os entregou, nas concupiscências de seus corações, à imundícia, para serem os seus corpos desonrados entre si; pois trocaram a verdade de Deus pela mentira, e adoraram e serviram à criatura antes que ao Criador, que é bendito eternamente. Amém." A obscuridade do coração, ou seja, da alma e do espírito do homem o faz ateu. Passaram a cultuar-se a si mesmos e entregam-se aos desejos da alma para encontrar algum prazer e gratificação.
Os que não podem crer são separados da vida de Deus conforme Ef. 4:18 - "... entenebrecidos no entendimento, separados da vida de Deus pela ignorância que há neles, pela dureza do seu coração..."
Este é o campo fértil onde atua Satanás com suas artimanhas, levando vantagem sobre a Igreja em manter os homens decaídos longe da mensagem da cruz. Ele não pode vencer os eleitos e regenerados espiritualmente, mas pode levar vantagens sobre eles em não deixar o evangelho verdadeiro progredir.
Sola Scriptura!
Sola Gratia!
Sola Fide!

segunda-feira, janeiro 16

QUEM É O DIABO I

I Pd. 5: 8 e 9 - "Sede sóbrios, vigiai. O vosso adversário, o Diabo, anda em derredor, rugindo como leão, e procurando a quem possa tragar; ao qual resisti firmes na fé, sabendo que os mesmos sofrimentos estão se cumprindo entre os vossos irmãos no mundo."
Alguém poderia questionar: por que escrever sobre quem é o Diabo, sendo mais honroso escrever sobre quem é Cristo. Perfeitamente! Acontece, no entanto, que, quanto menos se falar e reafirmar quem é o Diabo, mais ele se fortalece. É exatamente o que ele e seus seguidores visíveis e invisíveis querem que aconteça. Isto lhes dá a vantagem da dúvida e do esquecimento, concedendo-lhes mais espaço para continuar seu projeto nefasto contra Cristo e a sua Igreja. Então, ao escrever acerca do Diabo, não se pretende louvá-lo ou exaltá-lo de qualquer glória, pois ele não a tem.
Diabo provém do latim eclesial [diabolus] que, tendo sido transliterado para o grego eclesial como [διάβολος], o que resultou no vocábulo "diabolos". O vocábulo diabo, tanto no latim, quanto no grego significa "caluniador" ou "acusador". Desta forma tal adjetivo, quando utilizado como nome próprio só se aplica ao Diabo espiritualmente, porque ele é quem acusa os eleitos e regenerados de dia e de noite conforme Ap. 12:10 - "...porque já foi lançado fora o acusador de nossos irmãos, o qual diante do nosso Deus os acusava dia e noite.
O Diabo é chamado, na cultura judaica, de Satanás proveniente do hebraico [שָטָן] que, transliterado é "satan". Este substantivo é originário de um adjetivo, o qual significa "opositor" ou "adversário". Nas culturas judaica e árabe, Satan ou Sheitan pode ser referência geral a qualquer tipo de inimigo, opositor ou adversário, além de, também, ter sentido de inimigo sobrenatural.
Outra forma de se referir ao Diabo na cultura ocidental é Lúcifer. Tal referência tem a ver com a tradução de São Jerônimo, o qual traduziu a palavra hebraica [הֵילֵל] "hêlêl" erroneamente para o latim como "lux feros", ou seja"lúcifer." Entretanto, este não é o nome próprio do Diabo, mas uma expressão metafórica para se referir ao rei da Babilônia e sua queda prevista pelo profeta Isaías. O texto que se refere a expressão é Is. 14:12 - "Como caíste do céu, ó estrela da manhã, filha da alva! como foste lançado por terra tu que prostravas as nações!" Trata-se de uma analogia ao planeta Vênus, a "Estrela da Manhã" que é ofuscado pelo aparecimento do Sol. Por semelhante modo, o rei da Babilônia - um astro menor - seria derrotado pelo Messias - o Sol da Justiça - que viria trazer a glória à Israel. Portanto, a tradução errada da expressão "estrela da manhã" como lúcifer ou portador da luz foi incorporada como sendo um dos nomes próprio de Satanás. Não se trata, portanto, de um nome próprio, mas de uma locução adjetiva em forma de metáfora, comparando a falsa glória de um rei terrestre com a real glória de Cristo.
Este mal entendido na tradução da Vulgata - a bíblia em latim - por S. Jerônimo deturpou as coisas a tal ponto que se atribuiu a Satanás um título que é, na verdade, de Jesus, o Cristo. Isto porque, lúcifer provém do hebraico "heylel" que quer dizer "estrela da manha", "estrela d'alva", "luz da manhã" e "aurora." Metaforicamente, em textos diferentes, se refere ao rei da Babilônia e ao Sumo Sacerdote Simão, filho de Onias citado no livro apócrifo Eclesiástico 1:6, à Glória de Deus, ou a Jesus, o Cristo conforme Ap. 22:16 - "Eu, Jesus, enviei o meu anjo para vos testificar estas coisas a favor das igrejas. Eu sou a raiz e a geração de Davi, a resplandecente estrela da manhã."
O texto de abertura procede da carta do apóstolo Pedro aos judeus cristãos do primeiro século. Em muitas igrejas, de hoje, tal texto é utilizado para amedrontar os religiosos, como se dependesse deles a possibilidade de o Diabo os derrotar ou não. Todavia, o texto é muito claro ao afirmar que "O vosso adversário, o Diabo, anda em derredor, rugindo como leão, e procurando a quem possa tragar..." Na verdade, o texto afirma que ele anda ao derredor, procurando a quem possa tragar como se fosse um leão. Acontece que o título de "Leão de Judá" pertence a Jesus, o Cristo e não ao Diabo. Até nisto o adversário tenta ofuscar a glória de Cristo. Acrescenta-se ainda, que o Diabo não pode tragar ou se apoderar e destruir os eleitos e regenerados.
Aqueles a quem o Diabo pode tragar ou derrotar são os que não têm experiência de novo nascimento. Isto é mostrado claramente em I Jo. 5:18 - "Sabemos que todo aquele que é nascido de Deus não vive pecando; antes o guarda aquele que nasceu de Deus, e o Maligno não lhe toca." Os eleitos e regenerados não têm mais prazer na natureza pecaminosa, porque ela foi aniquilada e seus atos pecaminosos foram lavados no sangue do Cordeiro que tira o pecado do mundo. Desta forma, os nascidos de Deus não estão submissos ao reino das trevas e que Aquele que nasceu de Deus, a saber, Jesus, o Cristo, os guarda e o Diabo sequer pode lhes tocar. O fato de acontecer coisas ruins ou desagradáveis aos filhos de Deus, não quer dizer que foi o Diabo quem os derrotou. Muita coisa sucede aos filhos de Deus para o seu aperfeiçoamento na justiça de Cristo. O texto de abertura mostra isto claramente, ou seja, que muitos irmãos sofrem as pressões do mundo, mas não diz que são derrotados pelo Diabo.
Sola Scriptura!
Solo Christus!
Soli Deo Gloria!