Mc. 14: 38 a 41 - "Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; o espírito, na verdade, está pronto, mas a carne é fraca. Retirou-se de novo e orou, dizendo as mesmas palavras. E voltando outra vez, achou-os dormindo, porque seus olhos estavam carregados; e não sabiam o que lhe responder. Ao voltar pela terceira vez, disse-lhes: dormi agora e descansai. Basta; é chegada a hora. Eis que o Filho do homem está sendo entregue nas mãos dos pecadores."
No transcurso da vida cristã normal, muitas questões veem à mente dos eleitos e regenerados. Algumas postulações bíblicas ditas por Jesus, o Cristo, ou pelos apóstolos hagiógrafos parecem colocar termos e ideias em contradição. A regra áurea, neste caso, é que não existem contradições reais no texto escriturístico. No máximo existem aparentes paradoxos, a saber, conceitos que são ou parecem ser contrários ao que é comum, contra-senso, absurdo ou ideia dispare. O conselho é procurar aplicar o contexto geral e examinar o texto em sua língua original, se possível. Vê-se que a questão nunca é com o texto, mas com o costume herdado da cultura pseudocristã imposta a todos. A Bíblia não é um texto comum. Portanto, jamais será compreendida pelo senso comum. A compreensão se dá, primeiramente, pela revelação, e, secundariamente pela fé repartida a cada um segundo a medida de Deus.
O verbo vigiar em língua portuguesa é transitivo direto, ou seja, requer complemento para formar sentido completo. Significa 'observar com atenção, estar atento a...' e, ainda, 'observar secreta ou ocultamente, espreitar, espionar, guardar, tomar conta.' No texto neotestamentário escrito em grego popular ou koinê, o verbo vigiar é [γρηγορεo] que, transliterado, grafa-se "gregoreõ". No texto que abre este estudo nos versos 37 e 38 é utilizado este mesmo verbo, porém, flexionado em caso e pessoa: no verso 37 é [γρηγορησαι] ou 'gregorensai'; no verso 38 [γρηγορειτε] ou 'gregoreite'. Significando, respectivamente: vigiar e vigiai. O verbo vigiar nos sentidos já mencionados ocorre 23 vezes no novo testamento. Em todas elas possui sentido de estar atento para se proteger, se defender ou se precaver contra algum tipo de ataque. Em alguns destes textos, o sentido de vigiar é, também, de prescrutar, sondar, espionar e dedicar atenção específica para evitar sofrimento moral e físico. É bom lembrar-se que, antes da morte, ressurreição e ascensão de Cristo, os discípulos não eram nascidos de novo. Eram, portanto, susceptíveis de tentações e dúvidas de fé. A evidência concreta disso foi o caso de Pedro na noite em que negou Jesus. O texto mostra, claramente, a impossibilidade de o homem natural manter-se pela fé sem o novo nascimento. Isto porque, o espírito está pronto, mas a alma não está sob o controle dele. Lembre-se ainda que, carne no sentido bíblico, refere-se à alma e seus atos pecaminosos.
I Ts. 5: 6 e 10 _ "... não durmamos, pois, como os demais, antes vigiemos e sejamos sóbrios... que morreu por nós, para que, quer vigiemos, quer durmamos, vivamos juntamente com ele." Neste caso, o verbo vigiar não é utilizado metaforicamente no sentido de 'estar vivo, atento, desperto', porque foi posto em contraposição ao verbo dormir [καθευδω] 'katheudõ' que, neste contexto, não significa estar morto, mas significa indiferença e desconfiança na palavra de Deus. O apóstolo Paulo nunca utiliza o verbo 'katheudõ' ou 'dormir' em seus textos com o sentido de estar morto. O único caso em que tal verbo é utilizado, por Jesus, neste sentido é em Mc. 5:39 - "E, entrando, disse-lhes: por que fazeis alvoroço e chorais? a menina não morreu, mas dorme." Embora, Jesus, o Cristo tenha dito que a menina não morreu, mas, de fato, ela estava morta. O confronto entre vida e morte é algo tão marcante que os populares que estavam presentes riram de Jesus, o Cristo, porque disse que a menina não estava morta cf. verso 40 - "E riam-se dele; porém ele, tendo feito sair a todos, tomou consigo o pai e a mãe da menina, e os que com ele vieram, e entrou onde a menina estava." A diferença é que Ele é a ressurreição e a vida, diante de quem a morte não prevalece. Logo, tendo em vista o que Ele iria realizar e em seu propósito de ressuscitá-la, a menina não permaneceria morta. Assim, no texto de I aos Tessalonicenses, o sentido de vigiar é o de crer que, não importa a nossa condição humana de desatenção ou de sobriedade e vigilância, estamos em Cristo espiritualmente. Demonstra que a nossa salvação depende exclusivamente da nossa inclusão na morte de Cristo onde perdemos nossa vida almática para ganharmos a vida de Cristo. A expressão: "... como os demais..." do texto em tela, significa aqueles que são homens naturais. Estes, sim, estão em constante estado de catatonia espiritual, isto é, sono espiritual. O apóstolo Paulo está tratando do arrebatamento. Portanto, é uma questão de redenção plena e não de recompensa pelo que fazemos ou deixamos de fazer.
I Pd. 5:8 - "Sede sóbrios, vigiai. O vosso adversário, o Diabo, anda em derredor, rugindo como leão, e procurando a quem possa tragar." Neste texto é utilizado o mesmo verbo vigiar [γρηγορησατε] do qual já foi falado. Neste contexto não traz o sentido de ficar ansioso, preocupado e todo tempo procurando sinais de ataque do Diabo. Ao contrário, ensina que o acusador estará sempre nos espreitando e nos acusando diante de Deus por causa dos nossos erros. Não é nossa vigilância que o detém ou o afasta. Entretanto, ele não pode tocar naqueles pelos quais o Senhor Jesus morreu e ressuscitou. A maioria dos religiosos lê com atenção, este versículo, até a palavra 'leão'. Porém, não presta atenção ou não vigia sobre o que diz o resto do texto: "... procurando a quem possa tragar." Ou seja, o Diabo só pode exercer poder sobre aqueles que não têm a vida de Cristo. O ato de não ser sóbrio, não se manter vigilante e não perceber a vida de Cristo pode trazer apenas sofrimento social ou material. Jamais poderá nos separar do amor de Cristo. Não é nossa sobriedade e nossa vigilância que nos dá a redenção eterna.
Sola Gratia!
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