domingo, maio 31

O FATOR DILUVIANO III

Gn. 5: 22 a 24 - "Andou Enoque com Deus, depois que gerou a Matusalém, trezentos anos; e gerou filhos e filhas. Todos os dias de Enoque foram trezentos e sessenta e cinco anos; Enoque andou com Deus; e não apareceu mais, porquanto Deus o tomou."
Enoque foi o sétimo homem na linhagem de Adão. Ele viveu trezentos e sessenta e cinco anos e andou com Deus e, por conta disto, Deus o tomou para si em vida. Esta citação que aparece mais de uma vez nas Escrituras é suficiente para demonstrar que Enoque era homem temente a Deus. Enoque escreveu diversos livros e uma epístola. Um dos textos escriturísticos mais antigos é o da Bíblia Copta da Etiópia, o qual adotou o Primeiro Livro de Enoque como válido. Nas Escrituras judaica e cristã nenhum dos livros de Enoque foi arrolado como canônico. Entretanto, há diversas passagens bíblicas que citam textos de Enoque. Na epístola de Judas, não o Iscariotes, há a seguinte citação: "Para estes também profetizou Enoque, o sétimo depois de Adão, dizendo: eis que veio o Senhor com os seus milhares de santos, para executar juízo sobre todos e convencer a todos os ímpios de todas as obras de impiedade, que impiamente cometeram, e de todas as duras palavras que ímpios pecadores contra ele proferiram." Judas está exortando aos cristãos para terem cuidado com falsos mestres na Igreja e cita a profecia de Enoque contra tais homens cujas naturezas estão corrompidas pelo pecado. Nos versos seguintes, Judas compara os falsos mestres aos anjos caídos que abandonaram suas obrigações e formas corporais e se misturaram aos humanos. Também o autor da carta aos hebreus cita Enoque no roll dos justificados pela fé conforme Hb. 11:5 - "Pela fé Enoque foi trasladado para não ver a morte; e não foi achado, porque Deus o trasladara; pois antes da sua trasladação alcançou testemunho de que agradara a Deus.
Não se busca neste estudo fazer apologia ao homem Enoque, mas demonstrar que, apesar dos seus livros não constarem das Escrituras, isto não implica que era um homem ímpio e que sua doutrina era herética. A bem da verdade, os escritos de Enoque não foram incluídos na tradução latina chamada Vulgata, porque a Igreja Católica os considerou ofensivos. Ele descreve as suas revelações sobre os anjos caídos e suas aventuras sexuais com as mulheres humanas. Talvez isso fosse considerado pela igreja como algo perigoso e, por não o crer, não o aceitou. No capítulo quatro do primeiro livro de Enoque faz-se referência aos gigantes que habitaram a Terra antes do dilúvio. Desta forma havia familiaridade com estes gigantes nos tempos antediluvianos e as narrativas não são boas. Por isso, Deus determinou o dilúvio para dar fim a todos os seres viventes na Terra. 
No estudo anterior fez-se a citação de um texto enoqueano, no qual, relata-se que duzentos anjos caídos decidiram se mesclar com a humanidade, mantendo relações íntimas com as mulheres filhas dos homens. Para muitos, não passa de mais um texto apócrifo sem qualquer valia teológica. Entretanto, o mesmo relato se acha no Velho Testamento conforme Gn. 6: 1 e 2 - "Sucedeu que, quando os homens começaram a multiplicar-se sobre a Terra, e lhes nasceram filhas, viram os filhos de Deus que as filhas dos homens eram formosas; e tomaram para si mulheres de todas as que escolheram." Embora bem mais sucinto, o texto reproduz a mesma ideia do texto de Enoque. Estes "filhos de Deus", no texto de Enoque foram chamados de "anjos de Deus", porque se trata de filiação por criação. O termo hebraico para esta expressão é "B'nai haElohim" e faz referência aos anjos como criação direta de Deus. Não se trata de filiação como no caso de Cristo. A mesma expressão é usada em Jó 1:1 - "Ora, chegado o dia em que os filhos de Deus vieram apresentar-se perante o Senhor, veio também Satanás entre eles." Então, no sentido do texto, até mesmo Satanás é um anjo caído criado por Deus e que estava na assembleia de anjos. Fica claro, portanto, que é filho no sentido de criação e não de geração como referido sobre Cristo em Sl. 2: 7 - "Falarei do decreto do Senhor; ele me disse: Tu és meu Filho, hoje te gerei." As filhas dos homens aparece no texto hebraico como "b'noth haAdam", ou seja, "filhas de Adão", justamente, porque eram descendentes da raça adâmica e não porque foram geradas como filhas de Adão. 
Desta forma, descobre-se nos textos de Enoque e no de Gênesis capítulo seis que a causa do dilúvio foram as relações promíscuas e proibidas entre anjos caídos e mulheres humanas. A intenção de Satanás ao incitar tal depravação era contaminar a raça humana com o seu DNA maligno e, assim, tentar impedir o nascimento puro de Jesus, o Cristo. 
Desta forma, não foi apenas por causa da impiedade dos homens que Deus resolveu dar fim a todos os viventes conforme Gn. 6:3 - "Então disse o Senhor: o meu Espírito não permanecerá para sempre no homem, porquanto ele é carne, mas os seus dias serão cento e vinte anos." Deus deu um prazo de 120 anos para Noé apregoar a mensagem do dilúvio e preparar a arca. Após este prazo, o espírito inspirado por Deus no homem retornaria a ele conforme ensina Ec. 12: 7 - "... e o pó volte para a terra como o era, e o espírito volte a Deus que o deu." Acontece que, nessa época o povo não conhecia a chuva, porque não chovia. O solo era apenas regado pelo orvalho que caía devido a condensação dos vapores que subiam da Terra. Por isso, não acreditaram, porque chuva era algo desconhecido. Assim é nos dias de hoje, só creem no que podem ver, sentir e tocar. Gn. 2: 6 - "... porque o Senhor Deus não tinha feito chover sobre a terra, nem havia homem para lavrar a terra. Um vapor, porém, subia da Terra, e regava toda a face da Terra."
Observa-se que o fator agravante da iniquidade na Terra era a presença de seres chamados Nefilim ou "nephilim" que significa 'decaídos ou arrojados para a Terra', e não gigantes como foi traduzido do hebraico para a Vulgata de Jerônimo. Gigante em hebraico é "anak" e o plural seria "anakim". Entretanto, os nefilins eram mesmo gigantes, mesmo no texto de Enoque é dito que tinham 3.000 côvados e isto equivale a 13,50 metros. Tal fato é registrado em Gn. 6:4 - "Naqueles dias estavam os nefilins na Terra, e também depois, quando os filhos de Deus conheceram as filhas dos homens, as quais lhes deram filhos. Esses nefilins eram os valentes, os homens de renome, que houve na antiguidade." O texto afirma que os nefilins estavam na Terra e não que eram da Terra. Também o texto mostra que, após a copulação dos nefilins progenitores com as filhas dos homens, nasceram-lhes filhos que andavam pela Terra. Estes eram nefilins descendentes gerados pelos nefilins progenitores ou anjos caídos que se misturaram às mulheres humanas. Eram valentes e homens de renome na antiguidade. Isto é relatado em todas mitologias dos povos antigos desde o extremo oriente até o ocidente. Então, a referência é a dois tipos de nefilins: os progenitores e os filhos destes com as mulheres que eram homens valentes e famosos por suas proezas de maldade e força.
Gn. 6:11 a 14 - "A Terra, porém, estava corrompida diante de Deus, e cheia de violência. Viu Deus a Terra, e eis que estava corrompida; porque toda a carne havia corrompido o seu caminho sobre a terra. Então disse Deus a Noé: o fim de toda carne é chegado perante mim; porque a terra está cheia da violência dos homens; eis que os destruirei juntamente com a terra. Faze para ti uma arca de madeira de gôfer: farás compartimentos na arca, e a revestirás de betume por dentro e por fora." Ora, desde a queda de Adão e sua expulsão do Éden, a natureza humana ficou corrompida e inclinada à violência, iniquidade, impiedade e maldade. Então, não seria por esta razão única a resolução de Deus para destruir o mundo. Verifica-se que tal impiedade se multiplicou enormemente por causa da presença dos nefilins e seus filhos gigantes. Estes tinham enorme vantagem de força bruta sobre os homens e usavam isto para sobrepor-se à justiça e à retidão. Por isto, o texto diz que eles eram os valentes e de renome na antiguidade. Seus feitos eram extraordinários, comparando-se com a capacidade dos homens e dos animais. 
Desta maneira, decidiu Deus purificar a Terra e expulsar, tanto os anjos caídos que promiscuíam com as mulheres, como também, os gigantes filhos dessas uniões espúrias. O dilúvio foi, portanto, uma inundação para dar fim à vida de homens e animais, bem como expulsar os tais anjos caídos. Pedro dá indicações sobre estes anjos conforme II Pd. 2: 4 e 5 - "Porque se Deus não poupou a anjos quando pecaram, mas lançou-os no inferno, e os entregou aos abismos da escuridão, reservando-os para o juízo; se não poupou ao mundo antigo, embora preservasse a Noé, pregador da justiça, com mais sete pessoas, ao trazer o dilúvio sobre o mundo dos ímpios." Qual foi o pecado destes anjos? Terem acompanhado Satanás na sua rebelião? Não, porque desta forma todos os demônios deveriam estar aprisionados. Foram apenas aqueles que desobedeceram as ordens divinas e se promiscuíram com as filhas dos homens conforme o texto de Enoque e o texto de Gênesis. No texto de Pedro vê-se que os tais estão aprisionados nos lugares inferiores que é o significado de inferno ou em um lugar de escuridão chamado no grego de Tártaro.
Finalmente é necessário estabelecer alguns parâmetros semânticos sobre o termo ímpio. Há duas palavras homógrafas: a) ímpio; e b) impio. A primeira, com acento agudo, é adjetivo e/ou substantivo que significa aquele que não tem fé, que despreza a religião e que desrespeita os valores admitidos. A segunda, sem acento agudo, é também adjetivo e substantivo, porém significa: aquele que não tem piedade, desumano, cruel, bárbaro. Ora, então, por causa de um acento que não existe na língua original, muitos teólogos não conseguem ver com clareza que é uma referência aos nefilins e não aos homens e suas maldades derivadas da natureza pecaminosa. Desta maneira, o fator que determinou o dilúvio foi a introdução de práticas proibidas entre anjos e mulheres. A questão da maldade dos pensamentos do coração do homem é consequência e não a causa principal.
Sola Gratia!

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