domingo, junho 17

A DIFERENÇA ENTRE OS DONS ESPIRITUAIS E AS HABILIDADES ALMÁTICAS VI

At. 2: 1 a 11 - "Ao cumprir-se o dia de Pentecostes, estavam todos reunidos no mesmo lugar. De repente veio do céu um ruído, como que de um vento impetuoso, e encheu toda a casa onde estavam sentados. E lhes apareceram umas línguas como que de fogo, que se distribuíam, e sobre cada um deles pousou uma. E todos ficaram cheios do Espírito Santo, e começaram a falar noutras línguas, conforme o Espírito lhes concedia que falassem. Habitavam então em Jerusalém judeus, homens piedosos, de todas as nações que há debaixo do céu. Ouvindo-se, pois, aquele ruído, ajuntou-se a multidão; e estava confusa, porque cada um os ouvia falar na sua própria língua. E todos pasmavam e se admiravam, dizendo uns aos outros: pois quê! não são galileus todos esses que estão falando? Como é, pois, que os ouvimos falar cada um na própria língua em que nascemos? Nós, partos, medos, e elamitas; e os que habitamos a Mesopotâmia, a Judéia e a Capadócia, o Ponto e a Ásia, a Frígia e a Panfília, o Egito e as partes da Líbia próximas a Cirene, e forasteiros romanos, tanto judeus como prosélitos, cretenses e árabes ouvímo-los em nossas línguas, falar das grandezas de Deus."
O dom de falar em outras línguas se insere no grupo dos dons da fala e da comunicação pela expressão oral. Há grande confusão sobre este dom, porque cada um lê as Escrituras como bem lhe parece. Não deixam que as Escrituras falem por si mesmas e que elas digam o que têm a dizer. Na maior parte das religiões institucionais, o povo possui um nível cultural muito limitado. Isto contribui para a mistificação do dom e para a mitificação dos que se dizem portadores dele. Tendem a divinizar a pessoa que se diz possuir o dom e não a glorificar ao Deus que o concede.
Verifica-se no texto de abertura que, toda ação partiu exclusivamente de Deus, sendo, portanto, um ato soberano e monérgico. As línguas de fogo vieram do céu, os ruídos eram sobrenaturais, os discípulos ficaram cheios do Espírito Santo e não de si mesmos. Hoje há grupos que alegam ser os guardiões das verdades do pentecostes, afirmando que tal evento se repete. Entretanto, nunca, em nenhuma dessas igrejas se veem línguas de fogo repousando sobre pessoas, som como de vento e pessoas realmente falando em diversas línguas e os ouvintes entendendo em suas línguas nativas. Logo, em que aspecto o movimento pentecostal se baseia?
Falaram conforme o Espírito de Deus lhes concedia que falassem. Jesus fala sobre o dom de falar em novas línguas em Mc. 16:17 - "E estes sinais acompanharão aos que crerem: em meu nome expulsarão demônios; falarão novas línguas." No texto grego original a palavra 'novas' é [kainaiV] 'kainais', significando que são novas não no gênero, mas no ato de falar por parte dos que falam, ou seja, era algo novo aos discípulos. Implica dizer que as pessoas que receberam este dom, não falavam estas línguas antes e não as estudaram gramaticalmente para falá-las. A expressão grega do texto de Marcos é '... glóssais lalésousin kainais.' Tal expressão é muito significativa, pois 'laléo' em grego koinê é a capacidade de articular as palavras, utilizando os órgãos da fala para expressar algo que é dito com clareza.  É absolutamente diferente da palavra 'lego' que é 'chalrear', 'palrar', 'sussurrar', 'balbuciar' algo ininteligível. Assim, o que Cristo está ensinando no texto de Marcos é que os seus discípulos falariam claramente a palavra do evangelho, pois 'laléo' é anunciar, repetir, pregar, fazer soar a palavra audível com som distinto e inteligível. Então, 'glossais lalésousin kainais' é falar claramente em outras línguas compreensíveis e não em línguas estranhas como afirmam por aí nos arraiais do engano. Isto é confirmado em Is. 28:11 - "Na verdade por lábios estranhos e por outra língua falará a este povo." Finalmente pode-se dizer que, no texto de Marcos, Jesus afirma que o falar em novas línguas é um sinal, e o apóstolo Paulo afirma que os sinais são para os incrédulos e não para os eleitos e regenerados conforme I Co. 14:22 - "De modo que as línguas são um sinal, não para os crentes, mas para os incrédulos; a profecia, porém, não é sinal para os incrédulos, mas para os crentes."
Paulo deixa bem claro a importância de haver comunicação clara nas palavras conforme I Co. 14: 6 e 9 - "E agora, irmãos, se eu for ter convosco falando em línguas, de que vos aproveitarei, se vos não falar ou por meio de revelação, ou de ciência, ou de profecia, ou de doutrina? (...) Assim também vós, se com a língua não pronunciardes palavras bem inteligíveis, como se entenderá o que se diz? porque estareis como que falando ao ar." Observa-se ainda que, em toda extensão das Escrituras não se vê Deus falando ao homem em língua que ele não possa entender. Até mesmo as palavras que apareceram na parede do palácio do rei Belsazar eram compreensíveis, pois o rei apenas não entendeu a interpretação, mas era a língua nativa da babilônia conforme Dn. 5:25 - "Esta, pois, é a escritura que foi traçada: MENE, MENE, TEQUEL, UFARSlM." Também a mula do profeta Balaão falou de modo que o seu dono a compreendesse. Então, porque Deus daria um dom a alguém se não tivesse serventia e finalidade à sua glória? 
Há ainda uma outra questão com relação ao dom de falar em outras línguas. É que, de fato, a interpretação não significa tradução como fazem por aí. I Co.12:30 o verbo interpretar é 'ermeneuo' [ermhneuw], mas a forma que aparece flexionado na pergunta final é ‘diermeneiosin’ [diermhneousin] que é interpretar, explicar, ensinar ou dar significado. Logo, é uma tarefa de alguém que ouve algo em uma determinada língua real e existente e se põe a explicar o que ouviu. Não se tratando, portanto, de uma tradução sobrenatural de  suposta língua dos anjos como querem alguns religiosos carismáticos. Além disso, tal interpretação visa, tão somente, esclarecer a Palavra de Deus e não fazer vaticínios e adivinhações futurísticas, às  quais Deus condena claramente na Bíblia.
Finalmente, acrescenta-se que é muito comum alguém argumentar que o dom de falar em outras línguas é uma referência ao falar em língua dos anjos com base em I Co. 13: 1 e 8 – “Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o címbalo que retine. O amor jamais acaba; mas havendo profecias, serão aniquiladas; havendo línguas, cessarão; havendo ciência, desaparecerá.” Porém, o que está no texto não autoriza a ninguém falar em línguas de anjos. Na língua original do Novo Testamento, o grego koiné, a palavra 'ainda' é 'ean' [ean] servindo como introdução a uma clausula protética, um enunciado de condição, ou expressando probabilidade com o verbo no subjuntivo e, algumas vezes no indicativo. Assim, fica evidente que Paulo não está afirmando que alguém fala em línguas de anjos, mas apenas expõe o fato que, se isto fosse possível, ainda assim, seria inferior ao dom do amor. O texto não autoriza absolutamente nada mais do que isto! O que passa disto tem procedência da mentira cujo pai é Satanás.
Sola Gratia!

Um comentário:

Hélvia Paranaguá disse...

Santos, amei o tema e a abordagem. Continue nos brindando com estes estudos maravilhosos.
Abraço,
Hélvia