Jo. 6: 53 a 60 - "Disse-lhes Jesus: em verdade, em verdade vos digo: se não comerdes a carne do Filho do homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis vida em vós mesmos. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia. Porque a minha carne verdadeiramente é comida, e o meu sangue verdadeiramente é bebida. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele. Assim como o Pai, que vive, me enviou, e eu vivo pelo Pai, assim, quem de mim se alimenta, também viverá por mim. Este é o pão que desceu do céu; não é como o caso de vossos pais, que comeram o maná e morreram; quem comer este pão viverá para sempre. Estas coisas falou Jesus quando ensinava na sinagoga em Cafarnaum. Muitos, pois, dos seus discípulos, ouvindo isto, disseram: duro é este discurso; quem o pode ouvir?"
Antropofagia é a prática em que seres humanos se alimentam de carne humana. Há inumeráveis relatos deste tipo de ritual entre povos primitivos, na era dos grandes descobrimentos, por parte dos cronistas. Segundo tais relatos, os guerreiros vencedores acreditavam que, ao alimentar-se do inimigo vencido, tomariam suas forças e seus poderes para si. Não é este o caso doutrinado por Jesus, o Cristo no contexto do texto de abertura.
Neste discurso Jesus, o Cristo utilizou-se do método da linguagem figurada, objetivando evidenciar ensino espiritual. Esta é a razão pela qual os religiosos que o ouviam não o entendiam, pois tomavam por mera lógica aquilo que, de fato, é tipológico. Por isto questionavam entre si o seguinte: v. 52 - "Disputavam, pois, os judeus entre si, dizendo: como pode este dar-nos a sua carne a comer?"
No capítulo seis do evangelho de João vê-se um ferrenho debate entre religiosos judeus e Jesus, o Cristo. Os judeus não recebiam a verdade que Jesus, o Cristo é o Filho Unigênito de Deus. Negavam-lhe a origem celestial, vendo apenas o homem histórico - Jesus - no qual o Cristo eterno havia se encarnado conforme Jo. 1:14. Sem a fé é impossível receber Jesus, o Cristo como Deus. A fé se manifesta pela palavra de Deus a qual penetra, não apenas, no aparelho auditivo físico, mas também no ouvido da alma e do espírito mortos para Deus. Ainda que Jesus, o Cristo, lhes assegurasse que, para crer n'Ele como o Filho Unigênito de Deus era necessário receber revelação do próprio Deus, continuavam apoiados apenas na lógica analítica. Desta forma travou-se um embate, de um de um lado, lógico e, do outro lado, espiritual com base nas Escrituras. Tais realidades não são convergentes e, muito menos, concordantes, visto que, ao crer em um exclui-se o outro.
Jesus demonstrou-lhes que o maná enviado por Deus, aos hebreus no deserto, durante a travessia do Egito à Canaã, era incompetente para saciar a fome daquelas pessoas para sempre conforme Jo. 6:49. Entretanto, Cristo se apresenta como o pão verdadeiro que desceu do céu, eficiente e suficiente para sanar a fome e a sede de todo aquele que n'Ele crê. Todavia, a figura do pão que satisfaz a fome e do sangue que dessedenta é a metáfora do alimento que atende a fome e a sede espirituais. Isto porque, Jesus, o Cristo é a vítima sacrificial que, tendo o corpo crucificado e o sangue vertido na cruz, ofereceu a própria vida plena em substituição e inclusão dos pecadores eleitos. Quem não crê na sua inclusão na morte com Cristo e, consequentemente, na sua ressurreição juntamente com ele, não vê e não entra no reino de Deus conforme Jo. 3: 3 e 5.
Assim, ao se identificar como o pão e o sangue oferecidos na cruz para redenção do pecador, Jesus, o Cristo lançou mão da comunicação recursal para que, apenas os eleitos pudessem crer. Os incrédulos se escandalizam e ridiculariza tal discurso por não poder crê-lo. Ainda hoje o processo é o mesmo: o mundo incrédulo, religioso ou não, ridiculariza a fé verdadeira por meio de análises apenas racionais. A razão humana contaminada pela natureza decaída e pecaminosa jamais poderá crer na essência do evangelho. Tal verdade não se atinge por lógica, mas por revelação espiritual dada por Deus por meio do Espírito Santo. É uma ação absolutamente monergística e não sinergística.
Então, comer a carne crucificada e beber o sangue derramado na cruz é um ato totalmente assumido pela fé. Carne e sangue representam a plena humanidade do Filho de Deus, na pessoa augusta de Jesus, o Cristo conforme I Jo. 4: 2 e 3 - "Nisto conheceis o Espírito de Deus: todo espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus; e todo espírito que não confessa a Jesus não é de Deus; mas é o espírito do anticristo, a respeito do qual tendes ouvido que havia de vir; e agora já está no mundo."
Nos sacrifícios oferecidos no Santo dos Santos do Templo em Jerusalém, o sangue era espargido sobre o Propiciatória, justamente, porque pertence a Deus, uma vez que é no sangue que está a vida conforme Dt. 12:23 - "Tão-somente guarda-te de comeres o sangue; pois o sangue é a vida; pelo que não comerás a vida com a carne." Esta é a razão pela qual todo o sangue de Jesus, o Cristo foi esvaído na cruz. Foi a oferta da vida pelos pecados de muitos conforme Hb. 9:28 - "... assim também Cristo, oferecendo-se uma só vez para levar os pecados de muitos, aparecerá segunda vez, sem pecado, aos que o esperam para salvação." Os religiosos de hoje tomam os textos e os transformam em uma espécie de pantomima teatral. Falam sobre curas e libertações pelo sangue de Jesus, mas não sabem o que isto, de fato, significa porque não lhes foi revelado pelo Espírito Santo. Usam tais artifícios como uma espécie de magia branca para atrair pessoas às suas igrejas. Presumem possuir um poder que não lhes pertence e jamais pertencerá.
Diante destas realidades profundas e esplendentes, os que ouviam a Jesus, o Cristo disseram v. 60 - "Muitos, pois, dos seus discípulos, ouvindo isto, disseram: duro é este discurso; quem o pode ouvir?" A afirmação é concluída com uma pergunta: "... quem o pode ouvir?" A resposta é simples e sem interpretação alguma. Podem ouvi-lo e compreendê-lo aqueles aos quais Deus conheceu de antemão, os elegeu, os predestinou, os chamou, os justificou e os glorificou em Cristo antes dos tempos eternos conforme II Tm. 1:9 - "... que nos salvou, e chamou com uma santa vocação, não segundo as nossas obras, mas segundo o seu próprio propósito e a graça que nos foi dada em Cristo Jesus antes dos tempos eternos..."
O discurso da verdade, que é Cristo, sempre será duro e repugnante aos que se dirigem para a perdição eterna. A verdade para os que perecem é apenas um conceito!
Sola Gratia!